Acho que tudo começou quando andava no 9º ano, quando, em
Ciências Naturais, se falava do corpo humano e respectivos sistemas. A cada
novo sistema do corpo que aprendíamos, de uma doença nova eu padecia. Lembro-me
quando a matéria era sobre o Sistema Digestivo, falou-se do cancro e de alguns
sintomas e afins. Sei também que a partir desse dia, fiquei cerca de três
semanas com dores de estômago. Não era. Claro. Mas acreditava piamente que era
cancro do estômago e quando fosse ao médico já era tarde e por consequência
morreria.
Acho que desde essa altura já tive na minha cabeça milhares
de doenças incuráveis. Cancro na cabeça quando tinha enxaquecas. Insuficiência
renal quando por qualquer motivo fazia xixi poucas vezes por dia. Leucemia
quando me apareciam nódoas negras sem que eu me lembrasse de as ter feito.
Pneumonia quando me constipava. Tuberculose se tivesse um pouco de tosse. E
etc. E depois claro, os enfartes quando sentia uma picada que fosse no peito, e
avc’s e etc.
Quando fui trabalhar para o hospital, por um lado melhorei um
pouco porque aprendi a valorizar a minha saúde, olhando para os doentes, que
esses, sim, estavam gravemente doentes. Por outro lado, acabo também por associar
as doenças deles, com possíveis sintomas que eu nem tenho mas depressa começo a
senti-los.
Depois pergunto às
pessoas próximas de mim, que geralmente é a desgraçada da C. algo como: ‘’olha
sinto isto assim assim tu também já sentis-te? É normal?’’ e ela lá me responde
que sim, que é normal. E eu fico mais descansada e já nem penso mais nisso. Às
vezes são sintomas ou sinais que eu já tive, mas só quando não tenho nada que
fazer é que decido dar importância. Em vão. Eu sou uma ingrata, Deus me perdoe,
sempre fui saudável, é raro constipar-me, mas ainda assim não sei a sorte que
tenho.
A hipocondria é grave. Não gosto de lhe chamar doença, porque
para mim, não o é. É a apenas uma forma que eu arranjei para dar valor a mim própria
e a preocupar-me comigo em primeiro lugar. L. à parte, claro. Engraçado que não
sou nem um bocadinho hipocondríaca com a L. Ela acabou de nascer. Tem a saúde
toda em altas. Eu também, na verdade. Só nasci um pouquinho mais cedo.
Não sou pessoa de ir a correr para os hospitais assim que
acho ter algo grave, porque também sei, que sou só eu a imaginar coisas.
Sou hipocondríaca, mas tenho a noção disso, e por esse
motivo levo-a na brincadeira e divirto-me imenso quando tomo consciência das
doenças que já pensei ter.
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